quinta-feira, 28 de maio de 2009

Os loucos não são loucos. Eles vêem o mundo dos espíritos.

Durante 16 anos, um psiquiatra americano observou as alucinações dos doentes mentais, para concluir que OS LOUCOS NÃO SÃO LOUCOS. ELES VÊEM O MUNDO DOS ESPÍRITOS.

Pesquisa e texto de Olavo de Carvalho

Existe uma crença geral de que o louco vive num mundo seu, particular e fechado e vê coisas a que ninguém tem acesso. Mas o psiquiatra americano Wilson van Dusen, anotou, durante 16 anos, as narrativas das alucinações de doentes mentais e demonstrou que todos eles vêem basicamente a mesma coisa: espíritos. “Todos os delírios”, afirma Van Dusen, “são iguais e não são amontoados caóticos de visões e palavras, mas a descrição organizada de um minudo invisível, fantasticamente coerente.” Este mundo invisível corresponde, ponto por ponto, ao “mundo dos espíritos” descrito pelo teólogo sueco Emmanuel Swedenborg, no século 18 e não é exclusivo dos doentes mentais. Existe potencialmente em cada um de nós e, para ficar louco, basta afrouxar o controle da vontade e permitir que os espíritos qdquiram existência independente. Uma vez “despertos”, eles anulam a vontade do doente e passam a persegui-lo, a atormentá-lo e o obrigam a fazer todo tipo de coisas sem sentido aparente. Por isso, a maioria das pessoas jamais os vê. Só os médiuns e clarividentes notáveis, como o próprio Swedenborg, conseguem penetrar nesse “outro mundo” e depois voltar sadios e fortes para desempenhar suas tarefas na vida corrente. Para os outros, é quase sempre uma viagem sem retorno. O Dr. Wilson van Dusen trabalhou e fez experiências no Mendocino State Hospital, da Califórnia, considerado uma das melhores instituições psiquiátricas dos Estados Unidos. Ele já conhecia os escritos de Swedenborg e ficou chocado com a semelhança entre a descrição do mundo dos espíritos pelo teólogo sueco e as alucinações dos doentes. A hipótese de que o próprio Swedenborg estivesse louco, foi afastada logo de início, porque uma vida tão produtiva e equilibrada quanto a dele seria impossível sob a pressão de uma doença mental e também porque os pacientes temem suas experiências interiores e fogem delas, enquanto Swedenborg se deixava deliberadamente possuir pelos espíritos, para poder descrevê-los, interrompendo as experiências quando queria. Além disso, o próprio Swedenborg deixara muito claro que ninguém deveria buscar um contato com o mundo dos espíritos se não estivesse preparado para sair dele e retomar suas atividades. Normalmente este mundo permanecia fechado (as pessoas ignorando a existência dos espíritos e estes ignorando a existência das pessoas) e só se abria durante a loucura, quando a barreira da consciência era enfraquecida e quebrada.

Uma barreira que só se abre com a loucura

Na época de Swedenborg não havia nenhum conhecimento sobre esquizofrenia, mas ele teve uma intuição maravilhosa sobre o processo dessa doença, ao declarar que a quebra da barreira consciente ocorria quando a pessoa começava a dar demasiada atenção às próprias fantasias, por ser demasiado orgulhosa para buscar as satisfações normais da vida ou por não desejar mais ser útil socialmente. Hoje a ciência reconhece que a fuga da responsabilidade social é um componente fundamental da esquizofrenia e que aquisição de um papel útil na comunidade pode ser um caminho para a recuperação. Assim, Van Dusen concluiu que valia a pena investigar mais a fundo as hipóteses de Swedenborg e adotou para isso, um método puramente descritivo, observando e descrevendo as alucinações sem julgá-las, aceitando a palavra dos doentes que viam nelas a pura verdade.

Dois tipos de vozes: de nível baixo e de nível alto

Após coletar um volume impressionante de depoimentos, o Dr. Van Dusen notou que as diferenças entre as alucinações de alcoólatras, esquizofrênicos, epiléticos e drogados eram mínimas, se comparadas às semelhanças. Quase todos eles contam ter tido contatos com figuras ou personagens de “um outro mundo”, que irrompem em suas vidas repentinamente, atormentando-os, falando o tempo todo, fazendo ameaças e promessas e alterando seu comportamento. Embora ninguém mais os veja, esses personagens surgem para os doentes como dotados de existência real, independente da sua vontade. Referem-se a eles dizendo “eles”, “os outros”, “as vozes”, “os espíritos”. No entanto, nenhuma das figuras têm uma identidade precisa: adotam a forma de uma pessoa, logo em seguida de outra, desaparecem repentinamente ou então deixam de ter formas e passam a ter somente vozes, de modo que é impossível “pegá-las”. Há momentos em que o paciente não distingue mais entre ele mesmo e os espíritos, tão enfraquecida está a sua vontade. E em algumas dessas ocasiões, o espírito “conversou”diretamente com o Dr. Van Dusen. “Logo descobri”, afirmou van Dusen, em depoimento prestado à revista holandesa Bres, “que existem dois tipos de experiências nesse sentido e também dois tipos de vozes: vozes de nível baixo e de nível alto. As de nível baixo parecem vozes de bêbados que gostam de amolar os outros num bar. Elas propõem ações degradantes e, quando o paciente obedece, elas o xingam. Procuram achar um ponto fraco na consciência do paciente e começam a atacar esse ponto sem parar. Às vezes “roubam” recordações ou idéias da memória do doente, anunciam que ele vai morrer logo ou o induzem a fazer coisas idiotas, como ficar com o braço levantado, ameaçando-o de coisas terríveis se ele não fizer e rindo dele quando obedece. É uma coisa horrível, pois o paciente não tem alternativa.”
“Às vezes, prossegue Van Dusen, os espíritos tentam se apoderar de uma parte do corpo do paciente, um olho, uma orelha e ele então perde o controle dessa parte ou jura que ela não lhe pertence. Caso contrário, eles o perseguem, anunciando sua morte ou ameaçando causar dores, que realmente ocorrem, só para mostrar sua força. Um paciente viu uma corda descendo do nada, enquanto ouvia vozes que discutiam a melhor maneira de enforcá-lo”. O vocabulário e as idéias destes espíritos são limitados, eles não tem raciocínio lógico, muitas vezes nem memória própria. Mas segundo os espíritos mais altos, afirma Van Dusen, a tarefa dos espíritos de baixo nivele precisamente revelar as fraquezas da pessoa e isso eles fazem com uma paciência insuperável. Eles persegue o paciente repetindo sempre as mesmas coisas (m deles repetiu durante meses somente a palavra “olá”) e para isso não é preciso mesmo muita inteligência. Parecem estar presos às partes mais inferiores da mente do paciente, nunca mostrando um pensamento individual de nível mais elevado. Outra característica permanente dos espíritos de nível baixo é sua ausência de religiosidade. Eles procuram atrapalhar de todas as maneiras as práticas religiosas do paciente e alguns até afirmam provir diretamente do inferno. Quando o Dr. Van Dusen perguntou a um paciente totalmente possuído por uma dessas vozes, se era um espírito que falava por ele, a voz respondeu: “O único espírito que conhecemos é o das garrafas”.
Uns tagarelam sem parar, outros falam por símbolos
As alucinações com espíritos de ordem superior são mais raras. Um dos pacientes de Van Dusen tinha sido perturbado durante muito tempo por espíritos que discutiam o melhor modo de matá-lo. Um dia ele viu uma luz, grande como o Sol e soube imediatamente que esta luz era de ordem superior, porque ela o respeitava, se retirava sempre que ele sentia medo; ao contrário dos outros, que o atacavam com mais intensidade justamente quando ele ficava com medo. Ao contrário dos de ordem inferior, que tagarelam sem parar, os espíritos superiores só se comunicam através de símbolos, que às vezes escapam à compreensão humana. Parecem, diz Van Dusen, residir na camada do inconsciente, estudada por Jung, enquanto os espíritos inferiores estariam na camada dos instintos, estudada por Freud. “Aprendi”, conta Van Dusen, “a ensinar os pacientes a se aproximarem da ordem superior, porque os espíritos desta camada procuram fortalecer os valores da individualidade. Aconselhei aquele paciente a aproximar-se do Sol que havia visto e ele foi penetrando num mundo de novas experiências luminosas, que de certo modo lhe davam mais medo que o tagarelas idiota das vozes assassinas. Numa alucinação, ele estava estendido no chão ao longo de um caminho que tinha uma porta no fim. Atrás desta porta, ele sabia que estavam trancadas as forças do inferno. Ele estava a ponto de abri-la, quando apareceu uma figura imponente, que o aconselhou, através de telepatia, a deixá-la fechada e a acompanhá-lo a uma região onde ele teve outras experiências, que o ajudaram a sarar. Em outro paciente, as forças superiores se manifestaram através da figura de uma linda mulher. O paciente era um encanador com um curso secundário e a visão mostrou possuir conhecimento de mitos e religiões num nível superior ao da capacidade de compreensão do paciente.

O que querem esses espíritos?
“Sugar e dominar o mundo!”


“Alguns pacientes”, continua ele, “têm durante certo tempo experiências inferiores e superiores e se sentem presos entre o céu e o inferno. Outros têm somente experiências de nível inferior. Os superiores declaram que podem dominar os inferiores e de vez em quando mostram que isso é verdade, mas nunca na intensidade que os pacientes desejam: só na medida em que o próprio paciente se identifica com a ordem superior, perdendo o medo, é que os inferiores são dominados e calam-se. Essas narrativas apresentavam uma notável semelhança com as raras passagens da Bíblia sobre a obsessão, de modo que meus pacientes tinham as mesmas experiências que outros haviam tido milênios atrás.”
“A obsessão continua”, continua Van Dusen, “ocorre quando os espíritos são libertados, deixam de ser inconscientes e adquirem uma percepção de si enquanto entes separados. Embora se revelem sempre não religiosos, estou convencido de que a prática religiosa, em si, não é suficiente para dominá-los. Uma atividade socialmente útil ou a caridade efetiva ajudam muito mais.” Do mesmo modo, o mecanismo de obsessão observado por Van Dusen coincide plenamente com a descrição de Swedenborg, segundo o qual a obsessão estava instalada no momento em que os espíritos emergiam da sua prisão nas trevas e se tornavam conscientes enquanto seres separados. Nas observações de Van Dusen, há sempre um momento em que os espíritos começam a agir independentemente da vontade do paciente e, em seguida, o dominam mediante ameaças, chantagens, promessas e perseguições, até que o doente perde toda vontade própria. Certa vez, Van Dusen perguntou a um paciente, durante uma alucinação, o que queriam os espíritos. “Lutar, sugar, dominar o mundo”, respondeu a voz, acrescentando que para isso recorrem a todo tipo de estrategema.
“O Homem”, escreveu Swedenborg, eu seu livro Arcanos Celestes, “não faz coisas ruins e falsas por si mesmo: são os espíritos maus que cometem essas ações e o fazem acreditar que foi ele quem as fez. E, pior, quando o Homem realmente começa a acreditar na própria culpa, eles o acusam e condenam”. Van Dusen notou ainda que os espíritos induzem a pessoa a cometer asneiras e em seguida a fazem acreditar na própria culpa e praticar absurdos rituais autopunitivos. Do mesmo modo como uma diferença fundamental entre espíritos superiores e inferiores reside na infinita riqueza criativa dos símbolos criados pelos primeiros e na pobreza mecânica e repetitiva das falas dos segundos, Van Dusen observou também que os espíritos inferiores, além de não terem nenhum respeito pela individualidade do doente, ainda o trata como se fosse um autômato, uma máquina e procuram convencê-lo de que não passa de um objeto mecânico movido de fora.

A influência silênciosa que só reforça os homens

A observação coincide integralmente com a afirmação de Swedenborg em seu Diário Espiritual: “Por isso as pessoas andam por aí como máquinas. Aos olhos dos espíritos elas não são nada. Quando eles conhecem uma pessoa, que é um ser humano e também um espírito, acham que é uma máquina sem vida. Por seu lado, o Homem não esclarecido também vê o espírito como se fosse uma nada.” Paralelamente, o conteúdo das falas dos espíritos inferiores parecia estar limitado à memória do paciente, enquanto os espíritos superiores demonstravam conhecimentos que ultrapassavam tudo o que o paciente sabia. Swedenborg afirmava que os espíritos inferiores tinham perdido a memória ao morrer e tinham que se apoderar da memória do paciente, enquanto os espíritos superiores, embora não sendo divinos em si mesmos, transmitiam um conhecimento de ordem divina. Van Dusen também acha que os espíritos inferiores procuram inserir-se neste mundo apoderando-se de uma pessoa parecida com o que eles foram em vida, obedecendo, portanto, a uma lei de afinidade. Isto explica, segundo Swedenborg, porque o paciente acredita ter cometido atos que na realidade nunca praticou. Nestes casos, o espírito tem um domínio total sobre o paciente, que simbolicamente, morre, para o outro passar a viver em seu corpo. A necessidade do espírito inferior de apoderar-se do corpo explicaria também os casos de relações sexuais com espíritos, abundantes na literatura medieval e em alguns rituais primitivos, como o vodu haitiano. Já o espíritos superiores não mexem com o físico do paciente, só se comunicam através de símbolos. Esta influência é silenciosa e seu aparecimento é muito mais raro, na proporção de um para cada seis alucinações, segundo Van Dusen. Na conclusão de seu estudo, Van Dusen afirma: “Tive sempre a impressão de que os espíritos, bons e ruins, representam dentro do paciente certas forças inconscientes. A parte infernal mostra suas folhas pessoais, sua bitolação e sua estupidez. A parte celestial representa seus dons superiores – latentes e raramente usados. Alguns espíritos são muito mais inteligentes, outros, muito mais estúpidos que os pacientes. Parecem ser forças não-realizadas, não- vividas e que por isso causam confusão e mal. Uma paciente muito piedosa via cenas imorais; um ladrão e bêbado, negro, via uma história linda e comovente sobre o heroísmo dos grupos minoritários. O mundo dos espíritos se parece muito com as descrições de Swedenbor; ele é realmente o céu e o inferno no nosso inconsciente. São mundos que existem ao mesmo tempo fora de nós e dentro de nós.

terça-feira, 26 de maio de 2009

A Ponte Sonora entre Oriente e Ocidente

É impossível falar de música New Age sem citar o japonês Kitaro, um dos mais puros representantes do gênero. Toda a sua obra, dedicada à criação de harmonia e paz no planeta, reflete um contato íntimo com a Natureza. Em turnê mundial para o lançamento do CD Mandala, Kitaro esteve no Brasil no final de 1994.

Deva Sethu ou Masanori Takahashi – esses nomes – (o primeiro de sannyasin, o segundo oficial), tem sua síntese em Kitaro, o mago dos sintetizadores, o papa da New Age, a ponte entre os deuses e os homens, que é o significado do nome dado por Bhagwan Shree Raneesh (mais tarde conhecido como OSHO), a um de seus discípulos prediletos em todo o mundo. Um dos poucos a quem ele telefonava pessoalmente e que o ajudou muito, com apoio financeiro e criativo, no seu projeto de um ashram contemporâneo. Aquariano, 04 e abril de 1953, Serpente no horóscopo chinês, Kitaro vem encantando platéias de todas as idades há mais de 30 anos. Sua fama veio depois da trilha para um documentário da TV japonesa sobre a rota da seda, (Silk Road). Depois de vender milhões de discos, Kitaro entrou em retiro no monte Fuji, afastou-se de todos os mestres e foi buscar seu mestre na própria Natureza. Já tocava os tambores neste monte, numa cerimônia anual iniciada por ele mesmo, uma espécie de nova tradição. Ficava ali dias e dias sem comer ou dormir, tocando sozinho, até quase se consumir. Nessa hora, virava um dragão, segundo quem já assistiu ao ritual. Numa dessas noites, Kitaro resolveu sair do Japão e foi morar nas Montanhas Rochosas, no Colorado, (EUA). Lá, há 4.500 metros de altura e a uma temperatura de -25°C, ele constituiu uma nova família musical, com uma banda jovem, um brilhante produtor, (Gary Barlough, que trabalhou com Jon Anderson, Pink Floyd e Yes) e seu sócio no empreendimento americano, Eidhi Naito, amigo e empresário. Logo depois era chamado por Oliver Stone para criar a trilha de Entre o Céu e a Terra, belíssimo filme que encerra a trilogia de Stone sobre a cultura americana e a guerra do Vietnã. Com este trabalho, Kitaro entrou na cultura de Holywood, ganhando o Globo de Ouro de melhor trilha de 1994. Apesar de toda a sua riqueza, (seu estúdio nas Montanhas Rochosas pode abarcar um estádio de beisebol), Kitaro gosta de isolamento, silêncio e do respeito pelo seu processo de criação. Mas não faz isso por estrelismo; ao contrário, ele é extremamente humilde e me contou na suíte do seu hotel cinco estrelas em São Paulo (onde se hospedou para duas apresentações na capital paulista, no final de 1994), que não gostava de lugares luxuosos e sempre viajava com um “sleeping bag” (saco de dormir) para dormir onde quisesse. Nesta entrevista, ele fala um pouco da música, de seu processo criativo e religioso e de como sente sua missão – segundo ele, criar harmonia e paz, “curar” o planeta.
Como você se coloca como ser humano e músico?
Sei que a qualquer momento posso morrer. Por isso, em todos os momentos, seja falando, tocando, faço tudo 100% inteiro. Ir além do corpo humano é muito difícil. É como um estado de transe. Depois deste estado de transe, é a Grande Morte.
Do que se constitui sua dieta?
Fui vegetariano muitos e muitos anos. Hoje eu como de tudo, bebo algum álcool, mas controlo meu corpo e meu ser, além dos meus estados psicológicos. O elemento mais importante é que eu vivo numa grande altitude. Isso significa que o oxigênio é mais refinado e isso mantém a mente clara. A altitude tem muitos méritos. No Japão eu também vivia nas montanhas. Mas alimentação natural é essencial. A grande altitude, vivida na natureza, é o melhor antídoto contra qualquer ilusão. Os instrumentos musicais vem da Natureza, ela nos deus todos os elementos do som e dos instrumentos. Precisamos apenas nos afinar com estes instrumentos musicais e sua vibração e fazer com que as pessoas que os ouvem sintam o mesmo. Este é o meu sonho. Imagino um momento em que todos, ao mesmo tempo, bateriam palmas. Todos juntos, em uníssono, ao mesmo tempo. Se pudéssemos fazer isso juntos, talvez não houvesse mais guerras, mais necessidade de lutar. Hoje temos muito sofrimento no mundo. Eu não sei nem quantos países nesse momento estão em guerra. Temos de fazer alguma coisa. Eu tento através da música, essa é minha missão.
Você teve mestres, gurus, inclusive foi discípulo de Rajneesh (OSHO). Como você realiza esta noção de render-se a um mestre? Muitas pessoas não entendem que o importante é o movimento do discípulo e então o milagre acontece. Como foi para você?
Foi no começo dos anos 70, em Poona, na Índia. Mas hoje, tudo mudou ali. Eu não estou mais certo de que o espírito de Bhagwan e seu trabalho estão ainda lá. Baghwan foi meu amigo, como um tio, um parente e ele falava comigo sempre, me telefonava, até que ficou doente física e psicologicamente. Antes o ashram e as pessoas eram diretamente conectadas com Bhagwan (Kitaro comenta sobre o novo nome, OSHO, para designar o mestre e diz que nunca conseguiu “sentir” este nome) e depois passou e depois passou a haver “intermediários”. Hoje Baghwan não está mais aqui, mas podemos tocá-lo em qualquer parte, diretamente.
Ele falou alguma coisa especialmente importante para você?
Ele falou sobre minha missão. Meu nome é Deva Sethu, e Sethu quer dizer “ponte”. Conectar Ocidente e Oriente. Conectar pessoas a pessoas. Esta é minha missão, minha música. Nos últimos 20 anos é o que eu tenho feito! Ele disse: “Você vai para o mundo. Vá! Toque!” Outros mestres budistas me disseram o mesmo em outros templos e altares. E em Santa Fé, no Novo México, (EUA)um xamã me disse que se eu parar, vou morrer. Eu tento morrer a morte abençoada, meu corpo não é mais meu... A experiência é importante, qualquer experiência é importante neste planeta. A mestra coisa é vivida pelos mestres, só que eles tem a técnica de ensinar a liderança. Meu mestre é a Mãe-Natureza, ela é tão forte! Vivo a 4.500 metros de altura e às vezes a temperatura é de -50°C! É o mesmo quando toco os tambores: quero estar no limite todo o tempo. Eu não sei quanto tempo mais estarei aqui, mas já entreguei e entrego sempre minha existência quando toco. Quando não tiver mais a limitação deste corpo, poderei estar em toda a parte, como uma vibração.
Mas você sabe que o Budismo descreve o pós-morte demaneira não muito agradável. O Bardo Thodol, por exemplo, fala do medo da alma, das visões e sons aterradores...
Não, eu aprecio este corpo e sou muito agradecido a meus pais por me terem concebido, mas é a questão do elemento terra. O corpo sente tudo, demais. Gostaria de estar mais diluído.
Como você vive? É casado, vive só ou com amigos?
Eu não sei! Não gosto de ter alguém que controla meus momentos, minha vida. Vivi muitas emoções, conexões e acho que emoções e conexões são parte do destino. E ninguém conhece o destino. Eu vivi intensamente, mas neste momento não sei de nada, continuo aprendendo. Bhagwan talvez saiba de tudo... Eu gosto de, no caminho do aprendizado, olhar, sentir. Mas se o outro não é capaz de entender tudo, não precisamos ficar juntos. Por isso ela se foi (referência a uma amiga japonesa, também compositora, que havia chegado com Kitaro ao Brasil, mas que foi embora no terceiro dia, misteriosamente).
Você está usando instrumentos napaleses, tibetanos, chineses e africanos, percussão árabe e ao mesmo tempo, solos de guitarra em seu trabalho. Por que está utilizando elementos de rock no show? Para atrair mais pessoas? Se você trabalha com mulheres grávidas, faz um tipo de som; se faz um pop star show, é outro tipo. Como você sente isto por dentro?
Se decidimos fazer terapia, não precisamos do show. Quando é show, é entretenimento. Em matéria de som, muda muita coisa. Eu fala para a minha banda: “Isto é entretenimento, não é terapia, nem workshop de cura”. Mas nossa energia vai para a audiência – e esta é a terapia, a energia indo lá. Porque atrás deste show business nós colocamos nossa energia espiritual. Nosso show não é só auditivo ou visual, é um show espiritual.
Após o show, todos elogiam e destacam o espírito de unidade do seu grupo. De que maneira você consegue manter isto?
Todos os dias eu converso com eles, antes do show, em todos os movimentos. Este é meu trabalho: tocá-los, senti-los como uma banda. Todos são muito jovens, uma média de 25 anos. É como eu posso ensinar alguma coisa: o que é show business com entrega espiritual, como se concentrar, etc. ao mesmo tempo, essa é a minha família, meu grupo de performance e eu espero que ele cresça mais.
O que você faz durante o show se, por exemplo, sentir que algum músico do grupo “se perdeu”?
Isto não tem importância porque cada momento tem um movimento e, se temos o mesmo movimento, então perder-se não é uma coisa tão vital. Se o movimento for oposto, então tenho de fazer alguma coisa. Como um capitão, basta dizer: “Venha, volte”. Minha banda está começando agora, com esta turnê e eu espero muito deles, como uma nova geração fazendo música.
O que você acha da expressão New Age? Porque ela foi muito mal usada... Eu tentei escapar disto no Brasil e foi impossível; daí resolvi me assumir como uma “new new age”...
Começamos a categoria musical “new age”, quatro ou cinco músicos: Vangelis, George Winston, Andreas Vollenweider... Mas nós tínhamos este estilo de vida. Winston se focalizava na Natureza, nas estações do ano, como outono, inverno. Mas hoje todos usam os mesmos sintetizadores, soando como jazz... Não posso sentir nenhuma filosofia, nenhum estilo de vida nos músicos atuais. Cada artista deve ter sua filosofia e estilo de vida. E a música deve ser baseada na sua própria vida. Isso é importante. Em geral, quando se sampleia (Sampler é um teclado que reproduz os sons reais dos instrumentos acústicos), corta-se mais o alto e o mais baixo destes níveis de freqüência. Hoje toda uma tecnologia está destruindo o espírito do artista. É uma tecnologia “barata”. Muitas pessoas nem sentem, mas eu sinto. Eu preferia o vinil a essa limpeza do CD. São instrumentos produzidos em massa, para consumo e soam pobres. E músicos usam estes instrumentos e produzem discos. É muito fácil e o som parece melhor que o vinil, mas não é. Pode comparar: até sons de guitarra estão piores, porque não há bons microfones. A gravação analógica (típica do vinil) funciona de um jeito e a digital de outro. Se pudéssemos ver num microscópio, notaríamos que são totalmente diferentes. Sons analógicos são ondulados e suaves e os digitais são sons quadrados. Algumas companhias deverão iniciar uma era além do vinil, além do CD. Eu espero. Porque os CDs estão piorando. Mas o problema é a fonte da música, com instrumentos “baratos”.

“Raneesh (OSHO) foi meu amigo, como um tio, um parente e falava comigo sempre, até que ficou doente física e psicologicamente.”
“A altitude tem muitos méritos. O oxigênio é mais refinado e mantém a mente clara. No Japão eu também viva nas montanhas”.
“Meu mestre é a Mãe-Natureza; ela é tão forte! Ela nos deu todos os elementos do som e dos instrumentos.”
“Hoje temos muito sofrimento no mundo. Nem sei quantos países neste momento estão em guerra. Temos de fazer alguma coisa.”
“Eu preferia o vinil à essa limpeza do CD. Algumas companhias deverão iniciar uma era além do vinil, além do CD.”


Por Mirna Grzich