terça-feira, 10 de março de 2009

Os poderes da mente: promessa e ameaça

Quais são as consequências para a sociedade humana do desenvolvimento dos poderes da mente? O que ocorrerá quando a ciência tiver condições de explorar o potencial dos processos psíquicos ainda desconhecidos? De que forma nossa vida será afetada se as capacidades paranormais forem usadas, além de para o bem, também para o mal, tanto na política, como nos negócios, na defesa nacional, na educação, na medicina, na direção social??

Nossa mente tem capacidade que a ciência já admite, mas das quais ainda não conhece origem ou processo. O que importa é o que o cérebro humano, tão desconhecido até há pouco tempo, passa a revelar, sempre mais, poderes que ampliam os horizontes do homem, dotando-o de uma percepção mais acurada do que podem oferecer nossos cinco sentidos, da faculdade de entender pensamentos, do poder de curar, do controle cada vez mais da consciência e de tantas outras habilidades surpreendentes. Embora ainda enfrentando relutâncias, a ciência avança cada vez mais em direção ao desenvolvimento desse aparato psíquico do homem, que poderia auspiciosamente exapandir o alcance e as dimensões da comunicação humana e criar assim um mundo mais paífico. Poderia realçar o sentido da unidade humana, à medida que um maior número de pessoas percebesse um campo de consciência compartilhado por toda a humanidade, indepentemente de diferenças ideológicas, econômicas e raciais. Poderia também fornecer importantes processos de cura como complementação às formas tradicionais da medicina. Poderia agir como estímulo à maior compreensão científica da natureza humana e do universo. Essas são apenas algumas das razões convincentes inerentes ao fenômeno da pesquisa psíquica. Contudo, como se na frase de Julian Huxley, devemos ser "os encarregados da evolução na Terra, é melhor explorar esta faculdade latente com a máxima atenção às suas promessas e ciladas. Há grande desacordo entre os parapsicólogos sobre se o "psi" pode, de fato, ser mal empregado. Alguns argumentam que o "psi" emerge no contexto de um estado caracteristicamente benigno de consciência, que torna virtualmente impossível o funcionamento psíquico mal intencioando. Outros não encontram provas convincentes de que o "psi" seja, no vasto conjunto das possibilidades humanas, a única a não dar margem à corrupção e ao abuso. Parece antes mais plausível que o "psi" possa ser usado de maneira tanto destrutiva e mal intencionada como de maneira benéfica e aceitável. Encontramos na literatura das maiores religões orientais, particularmente no hinduísmo, advertências de que as capacidades psíquicas podem ser mal empregadas. Mais recentemente surgiram provas científicas que tendem a amparar tais advertências. O físico inglês Benson Herbert esteve na Rússia e em duas ocasiões sofreu o incrível poder da médium Nina Kulagina. Escreveu no Jornal of Paraphysics (1973).

"Kulagina cura, mas tmbém pode ferir, quando quer."

"Eu me enrijeci quando ela segurou levemente meu braço, acima do pulso. Depois de mais ou menos um minuto, comecei a sentir uma profunda dor física e precisei cerrar os dentes e bater na testa com a mão livre, para suportar a continuação da experiência. Não sei ao certo quanto tempo aguentei, mas acho que foi entre quatro e cinco minutos, depois do que, involuntariamente, caí num sofá e Kulagina libertou-me por sua própria vontade. Passaram-se alguns minutos antes de me recuperar e verificar a área queimada. Estava doloria ao toque, de um vermelho vivo e ligeiramente inchada, como se tivesse sido exposta ao fogo. No meu caso, a queimadura só desapareceu depois de oito dias, já estando eu de volta à Inglaterra." Referindo-se à comprovada capacidade de Kulagina de fazer parar o coração de um sapo, (retirado do sapo, mas mantido vivo em meio apropriado), Herbert afirma: "Agora não me é difícil acreditar que ela pode fazer parar o coração de um sapo. Seus poderes podem, de fato, serem usados como cura negativa, - para ferir um organismo - se assim o desejar, mas naturalmente só faz isso como demonstração para nosso conhecimento científico. Acho possível que se Kulagina tivesse segurado meu braço por meia hora, eu teria seguido o mesmo caminho do coração do sapo."

Há crimes fáceis de cometer com uma ajuda "psi"

Por mais dramático que seja este relato, permanece o fato de existirem poucas provas em que basear conclusões positivas quanto à extensão em que o "psi" pode ser mal empregado. Outras pesquisas poderão revelar que o "psi" não representa uma ameaça significativa para o bem estar humano (principalmente com relação à todas as outras inúmeras fontes do mal). Contudo, neste ínterim parece sensato planejar para o pior enquanto esperamos o melhor. O descontrolado entusiasmo da humanidade para obter o saber já levou à tragédia antes. Aprendemos através de penosa experiência que o poder de ampliar o saber não confere automaticamente o poder de empregá-lo sensatamente. Portanto, uma aproximação conservadora para explorar o “psi” deve considerar seriamente a possibilidade do abuso desse poder que surge na mente e investigar essa possibilidade; se for possível o mau emprego do “psi”, devemos explorar as implicações sociais do desenvolvimento do funcionamento psíquico e usar essa compreensão para o construtivo desabrochar desse potencial humano. Presumindo, então, que o “psi” pode ser mal empregado, que formas este mal emprego assumiria? Vamos supor que uma pessoa tem significativas capacidades psíquicas. Em outras palavras, que obtém informações psíquicas ou o poder de projetar “formas de pensamento” com tal precisão que podem causar mudanças de vulto no desfecho de situações da vida real. Agora vamos examinar as seguintes suposições: suponhamos que esta pessoa é um homem de negócios ou um político com capacidade ara ler com exatidão as emoções de outra pessoa, mesmo que ela esteja fisicamente distante. Usaria ela essa capacidade em benefício do negócio ou da política? Suponhamos que um poderoso telepata, capaz de transmitir imagens de pensamento à mente de outras pessoas, viu um pai surrando seu filho. Usaria ele sua capacidade de telepata para projetar na mente do pai que existe meios mais salutares de ser e de proceder? Outra hipótese: alguém pretende, ao mesmo tempo que duas outras pessoas, conseguir importante promoção no emprego. Essa pessoa usaria suas consideráveis capacidades telepáticas (desconhecidas pelos outros), para ajudar a persuadir o empregador a conceder-lhe tal promoção? Ou ainda: um homem tem capacidade para entortar chaves e outros objetos de metal. Fica sabendo que foi identificado como provável “criminoso político” pela ficha de um computador do serviço de inteligência do governo. Tentaria ele empregar sua capacidade psicocinética para atrapalhar ou apagar a memória do banco de dados do computador? Todos estes processos possuem uma qualidade que compõe o dilema ético que podem apresentar: ainda que possam ser observados os efeitos do funcionamento psíquico, a fonte humana desses efeitos é impossível de ser descoberta pelos meios comuns de detecção científica. Por sua vez, a fonte humana de acontecimentos psíquicos não pode ser detectada, os abusos da “psi” não podem ser punidos. Assim, se a energia psíquica existe abaixo do limiar observável pela física moderna, então, sem correr risco de detecção muita gente poderia querer o “psi” em benefício próprio. Quantas pessoas seriam capazes de desenvolver níveis significativos (e portanto, potencialmente perigosos ou benéficos) de funcionamento psíquico? Falando por metáfora, diria que nossa consciência, quando estamos acordados, talvez se assemelhe à energia da luz de uma lâmpada. Apesar de aceitarmos sem questionar o milagre de seu poder de iluminação, até pouco tempo pouca gente sabia que a luza poderia ser focalizada com tanta intensidade e determinação que atravessaria uma chapa de aço (como certos lasers militares). Da mesma forma, poucos suspeitam do poder que jaz adormecido na atenção dispersa e não focalizada. Quase todas as pessoas tem capacidade inata de tornar-se mais autoconscientes e assim assumir maior controle sobre o uso da consciência. Parece, pois, admissível dizer que a maioria das pessoas tem, em princípio, acesso, à capacidade psíquica. Apesar de o desenvolvimento da autoconsciência ser um processo difícil, está sendo hoje empreendido por muita gente. Considerado sob esta perspectiva, o funcionamento psíquico não é uma capacidade mágica e acessível só a alguns; é, antes, um componente de nosso potencial humano normal, mas em estado latente.

Para uns, a consciência é só um subproduto bioquímico

Como assunto prático, o funcionamento psíquico significativo está, em geral, restrito a algumas pessoas. Contudo, considerando o aumento do interesse cultural e a exploração científica desse funcionamento, é provável que saibamos logo o quanto esta capacidade pode ser transformada de potencial adormecido em capacidade manifesta. E destas, quantas poderiam fazer um mal emprego do “psi”? Uma resposta conclusiva seria prematura – nós simplesmente não sabemos o suficiente. Contudo, arrisco dizer que uma pequena fração da população – talvez a metade de 1%, que é mais de um milhão de pessoas, na América – poderia desenvolver em grau desconhecido e empregar par ao mal este poder da mente, atualmente em grande parte adormecido. Em grau bastante amplo, cada indivíduo é um microcosmo das crenças, valores e comportamentos que a grande cultura fornece. Consequentemente, é impossível divorciar a ética do “psi” do contexto cultural dentro do qual o “psi” existe. Apresentamos abaixo três perspectivas culturais contranstantes ou percepções do mundo. Encaixado em cada concepção do mundo, há um aspecto particular da natureza, da realidade que influencia mais fortemente as maneiras básicas de como as pessoas percebem, pensam, crêem e agem. Ao explorar o desenvolvimento e o uso do “psi” nesses contextos alternativos, podemos compreender melhor quais os ambientes culturais mais propícios, tanto para uso pacífico como não pacífico do “psi”. Primeiro há a concepção do mundo materialista, que acredita que o real é aquilo que pode ser detectado pelos cinco sentidos; como a realidade destes é material, a primeira meta da vida humana deve ser compreendida em termos de crescimento material; só o presente momento existe e não há meios de conhecer o futuro, a não ser através de análises lógicas das tendências empíricas; a consciência é apenas um subproduto das atividades bioquímicas do cérebro e assim é sinônima ou idêntica à atividade do cérebro. Nossa consciência não pode ter qualquer efeito sobre o mundo para além de nosso corpo, etc. Considerando a estrutura restrita dessa crença, parece improvável que qualquer funcionamento psíquico pudesse desenvolver-se. Contudo, a concepção do mundo – como os seres humanos - contém contradições e paradoxos. Realmente, na América existe uma crença bastante difundidas nas capacidades psíquicas. Uma pesquisa da opinião nacional dirigida pela organização Toper (1974), indica que 53% dos americanos acredita na existência de percepção extra-sensorial – uma crença que ao contrário do que se poderia imaginar, aumenta proporcionalmente aos níveis de educação. Por exemplo: 68% dos que tem instrução superior expressaram sua crença no ESP, em contraste com 26% dos que só tem o curso primário.

O espírito primeiro, depois a vida material

Por uma lado, o funcionamento psíquico pode favorecer o aumento da percepção interior e a transformação saudável da concepção de nosso mundo materialista; se assim for, essa mudança poderia proporcionar um ambiente mais sadio para o desenvolvimento das capacidades psíquicas. Por outro lado, o “psi” pode ser aplicado como poderoso instrumento numa sociedade tecnologicamente “adiantada”. Apesar de partes de nossa sociedade parecerem bem encaminhadas na senda inicial da transformação social, restam muitos motivos de apreensão à respeito de como o “psi” será usado. Consideramos as implicações sociais e éticas dos seguintes anúncios: “Como fazer os outros seguirem suas ordens... Novo poder está prestes a entrar em sua vida... Uma espantosa maneira nova de controlar os pensamentos e ações dos outros em seu conhecimento... Não importa que eles não desejem seguir suas instruções; vão executá-las todas as vezes ao pé da letra... Você estará dirigindo o show. Faça um pedido e veja os que estão á sua volta deixarem tudo e fazerem o que são mandados. (National Enquirer, 29 de julho de 1975).
Você pode usar o “poder espiritual” e ganhar dinheiro. Você precisa de dinheiro? Deseja ter dinheiro? Pode ter o dinheiro que quiser, grande quantidade dele. Muitas pessoas descobriram o segredo de chamar o dinheiro e usá-lo. Estão dirigindo belos carros, viajando, vivendo em grandes casas e aproveitando o melhor da vida! (Other Dimensions, 1974)
Estes anúncios promovem o uso manipulado do “psi” e são destinados a interessar um grande número de pessoas. Felizmente, não há a menor prova de que tenham resultado maior que alguns dólares para seus promotores. Ainda assim, demonstram bem a grande receptividade potencial de um grande número de pessoas para a exploração dos usos do “psi”. Dessa forma, a concepção do mundo materialista contém grande potencial para encorajar o mau uso das capacidades psíquicas, assim que estas vençam um sistema restritivo de crenças e sejam integradas na sociedade. Em segundo lugar, vem a concepção do mundo transcendental, que admite um aspecto muito diferente da natureza da realidade. Admite que o aspecto espiritual ou consciente da realidade é fundamental e o aspecto material é secundário; a vinculação às posses materiais é um desvio da principal meta humana de descoberta das dimensões espirituais da existência; toda realidade é consciência e a descoberta espiritual tem prioridade sobre a mudança social; os fenômenos psíquicos são ocorrências comuns ao longo do caminho da descoberta espiritual, mas devem ser evitados com qualquer outra vinculação e assim por diante. Em vista de nossa compreensão neste contexto cultural, deveríamos esperar que o funcionamento psíquico se desenvolvesse com um subproduto do crescimento da consciência (um aspecto comum da literatura esotérica e espiritual). Contudo, muitas das principais religiões aconselham a considerar os poderes psíquicos como um obstáculo no caminho da maior compreensão e a não lhe dar muita importância. E sob esta concepção do mundo, em que o “psi” é considerado uma forma de “materialismo espiritual”, que eu esperaria o menor abuso do “psi” relativamente aos níveis manifestos da capacidade psíquica.
Em terceiro lugar está a concepção do mundo transformativa, que acredita que a realidade tem dimensões tanto materiais como espirituais (ou consciência); a consciência impregna toda a matéria – “a matéria revela a face do espírito”. A primeira incubência do homem é espiritualizar a dimensão material da existência, manifestando ou fundamentando as qualidades espirituais deste mundo; as capacidades psíquicas existem realmente em circunstâncias propícias e podem ser importantes para a transformação espiritual deste mundo e assim por diante.
Não se evita uma coisa boa, mesmo se é perigosa
Sri Aurobindo, talvez o mais conhecido expoente dessa concepção, diz em seus escritos sobre os poderes psíquicos: “Todas as coisas boas do mundo tem deformações e perigos, mas isso não é motivo para evitá-las todas. O que é preciso é a atitude certa e a discriminação, treinamento e disciplina... O ocultimso... é um instrumento indispensável para aqueles que procuram manifestar o divino de maneira concreta”. É dentro do contexto da concepção transformativa do mundo, - que reconhece o funcionamento psíquico e o considera, quando acertadamente empregado, como instrumento adequado ao processo da transformação social e humana – que talvez encontremos o maior potencial para o desenvolvimento e o uso das capacidades psíquicas. E se tomarmos os moldes históricos da destruição humana em nome de fins religiosos como guia, esta concepção do mundo talvez contenha grande potencial para o mau uso do “psi”. Existe motivo para apreensão quando examinamos a afinidade entre essas concepções do mundo alternativas e as sociedades ocidentais de hoje. As duas concepções (materialista e transformativa) que mais de perto se aproximam da concepção do mundo das sociedades ocidentais, são também as que parecem conter o maior potencial de encorajamento ao abuso do “psi”. Considerando nosso atual nível de maturidade social, parece imprudente discutir abertamente o uso e o abuso potencial do “psi”. Contudo, o “segredo” já foi divulgado. A revolução informativa alcançou o conhecimento esotérico. A natureza e os usos do “psi” são abertamente explorados em livros, artigos e pela mídia visual. Além disso, existe o número crescente e a diversidade de “disciplinas-consciência”, que dão acesso à regiões da consciência muitas vezes associadas à expressivo funcionamento psíquico. O treinamento, que antes se restringia à uma elite religiosa educada, foi democratizado e é agora acessível às massas. Além disso, os instrumentos da ciência já revelaram demais sobre o fenômeno psíquico para permitir que sua existência seja fácil e rapidamente esquecida. Esses indicadores sugerem que há grande movimentação em nosso crescente envolvimento com o “psi” e que o tempo de reconhecermos esta capacidade humana que surge pode estar próximo. Se assim for, devemos empenhar-nos para que o uso desses poderes seja cuidadoso. A importância do “psi” não reside somente, ou principalmente nos próprios fenômenos. Mais propriamente, os fenômenos psíquicos nos confrontam como fato mais básico do significado de nossa própria consciência ou campo de percepção. Realmente os fenômenos “psi” são janelas que revelam enorme fronteira humana: a evolução da consciência do indivíduo em comunidade com outros. Parece que agora estamos sendo puxados cuidadosamente, mas com crescente insistência para esta imagem da possibilidade humana e simultaneamente empurrados pela crescente compreensão de que a solução satisfatória de muitos problemas sociais sérios requerem o crescimento profundo da percepção humana. Se o “psi” for condenado porque dele abusam, a maior tragédia seria se, simultaneamente, toda a esfera da evolução da consciência também fosse condenada. Então, por importantes razões nossa cultura deve incentivar o uso pacífico deste aspecto periférico, mas não trivial do ser humano.
Por Duane Elgin

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